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Carta aberta em Defesa de

A Grande Síntese de Pietro Ubaldi

Uma crítica ao artigo “Uma análise científica de algumas afirmações

de A Grande Síntese”, de Alexandre Fontes da Fonseca

 

I – Explicações iniciais

Em 2014, foi publicado no Jornal de Estudos Espíritas e amplamente divulgado pela internet[1], um artigo de autoria do Físico Alexandre Fontes da Fonseca[2] com críticas à obra fundamental de Pietro Ubaldi, A Grande Síntese, o qual será nossa referência no desenvolvimento do presente texto. Este renomado cientista e estudioso do Espiritismo tem divulgado valiosos trabalhos que visam à fusão da Doutrina dos Espíritos com a ciência atual. Trata-se de alguém que merece todo o nosso respeito, por se respaldar em sólida formação acadêmica e científica, fazendo-se jus, naturalmente, aos nossos créditos e louvores.

Escrevo, não com o respaldo da ciência, a qual não estou autorizado a representar, mas como um estudioso da revelação de Pietro Ubaldi, a que me dedico há 36 anos. Apresento-me também como um aficionado do Espiritismo, doutrina que igualmente tem merecido minha atenção desde que aportei a este mundo, por haver nascido em um lar espírita e ter recebido a educação kardequiana desde as primeiras letras[3].

A intenção de escrevê-lo nasceu de vários questionamentos que venho recebendo a respeito das pertinentes críticas elencadas por Fonseca, desde que foram publicadas na internet, em 2014, até recentemente. Chegaram-me, não por eu ser uma referência em Ubaldi, mas por destacar-me em participações em Congressos e haver publicado vários artigos e livros sobre a obra do Missionário da Úmbria[4]. Não represento, evidentemente, uma autoridade no assunto e sequer tenho cabedal para elevar uma voz em sua defesa. Além do mais, sei perfeitamente que Ubaldi não necessita de alguém que o defenda entre nós. Apenas quero deixar registrada a minha modesta opinião sobre o referido artigo, não com o fito de despertar polêmicas, mas para que se sirva como uma opção a todos que se inquietaram com os comentários de Fonseca.

Quando ainda vivia entre nós, Ubaldi nunca se interessou por responder às muitas acusações que lhe chegavam. Tanto estas quanto os elogios nunca alteraram o seu comportamento, como nos conta o seu biógrafo José Amaral: “Aceitava uns e outros da mesma forma, com a compreensão de quem conhece o ser humano, sabendo agradecer e per­doar.”[5]

Certamente, a vida em sua sabedoria, sabe resguardar o que detém valor para o nosso indispensável progresso e as grandes ideias que movem a nossa humanidade em nada se deixam afetar pelas nossas opiniões particulares e nossos ruidosos ataques. De modo que o tempo dirá se Ubaldi está certo e detém o direito de subsistir para nortear o saber humano ou será esquecido como inútil alarde. Esse é meu consolo e estou ciente de que este pequeno respaldo que aceno em sua defesa será sepultado se não corresponder aos sábios interesses das forças que nos orientam a evolução.

II – Introdução

Esclareço de imediato que concordo plenamente que a obra A Grande Síntese não é um trabalho isento de equívocos científicos, em absoluto. Qualquer leitor com um mínimo de conhecimentos científicos poderá identificá-los, e com relativa facilidade. E não só no seu livro fundamental como também ao longo de sua vasta obra de 24 volumes. No entanto, a portentosa catedral de pensamentos erguida por Ubaldi sobrevive às muitas críticas, certamente por trazer valores extraordinários que ultrapassam os seus deslizes, não se justificando ignorá-la ou mesmo condená-la simplesmente porque o autor cometeu alguns justificáveis percalços, segundo o parecer de nossos conhecimentos atuais. E como veremos a seguir, são erros que dizem respeito mais às vestiduras das ideias do que propriamente aos conceitos que perpassam.

A Grande Síntese não é uma obra científica e tampouco Pietro Ubaldi era um cientista. Ele se formou em Direito, mas atravessou a vida como um modesto professor de inglês para ginasianos na velha Itália. Portanto, o que ele sabia da ciência de sua época estava limitado aos seus estudos particulares. Trata-se, no entanto, de alguém com refinada inteligência e dilatada visão intuitiva da fenomenologia do universo, o que lhe valeu a alcunha de místico ou inspirado e lhe permitiu discorrer sobre os mais diversos assuntos pertinentes, sobretudo, à esfera do Espírito. Sua obra, desse modo, tem um caráter revelador, ressaltando importantes preceitos de natureza filosófica, com consequências morais e religiosas. E terminam por tecer uma nova visão de mundo que importa não apenas aos domínios da ciência, mas servirá como uma nova orientação filosófica a permear todo o saber humano.

Ubaldi tornou-se conhecido após a publicação de seu primeiro livro, A Grande Síntese, escrito de 1932 a 1935, considerado por muitos como uma psicografia, sobretudo por sua contundente linguagem, registrada na 2ª pessoa do plural, como se uma entidade lhe ditasse diretamente os escritos. Não obstante, não se trata de uma psicografia espírita propriamente, pois não foi ditado palavra por palavra por uma personalidade humana desencarnada. O próprio Ubaldi a define como uma fonte inspiradora[6], de ordem superior, que não podia ser individualizada como uma entidade propriamente dita. Ele a entendeu como uma “Voz interior”, declarando: “Chamei assim a essa fonte de pensamento, de vontade, de ação e de afeto, que me inundava todo; chamei-a assim, com sinceridade e simplicidade, incapaz de definir melhor, para dizer: a voz daquele que ouço”[7]. E lhe registrou a impossibilidade de defini-la com exatidão: “Não perguntes meu nome, não procures individuar-me. Não poderias, ninguém o poderia; não tentes uma inú­til hipótese”.[8]

Desse modo, Pietro Ubaldi apresentou-se inicialmente como um médium, atraindo a atenção sobretudo dos espíritas espalhados pelo mundo, marcadamente em nossa nação, em decorrência de nossa natural tendência a absorver o espiritualismo, em todas as suas expressões. Não foi ele, porém, um médium na acepção propriamente espírita do termo. Informa-nos o próprio autor que sua mediunidade, que ele chama de “ultrafania”, era produto de uma especial captação de correntes de pensamentos superiores. Portanto, ele se sentia orientado por uma elevada intuição, escrevendo não como alguém que passivamente registra o que lhe é ditado por uma entidade externa, mas elaborava suas próprias conclusões ante as correntes psíquicas que lhe banhavam o maquinário mental. Natural, assim, que a pureza do fluxo de ideias a lhe perpassar a mente fosse contaminada pelas limitações de seu próprio psiquismo.

Por isso, não podemos considerar que uma “entidade superior” ditava diretamente a Ubaldi as páginas da obra, como se ele fosse uma mera máquina de datilografia. O “médium”, nesse caso, não estava sob a interferência direta de uma entidade, mas apenas captava um poderoso fluxo inspirativo, o qual, por questão de estilo, levava-o a escrever como se fosse um agente totalmente externo. Portanto, não estamos autorizados a considerar que “Sua Voz desconhecia determinado assunto” ou “errou ao fazer certa afirmativa”, como habitualmente o leitor espírita tende a julgar. Podemos, sim, aferir que o psiquismo do receptor, no caso Ubaldi, não detinha conhecimentos adequados para interpretar corretamente determinado fluxo de ideias a lhe bombardear o cérebro físico, registrando-o segundo sua capacidade de compreensão. A fonte inspiradora, nesse caso, está muito além de nossos juízos e julgamentos.

Na obra Problemas do Futuro, Ubaldi esclarece-nos que o seu método se caracterizava como um fenômeno inspirativo e não de escrita direta, concluindo que “tudo se reduz a um registro de visões conceituais”. E nos explica: “Pude, então, precisar que se tratava de mediunidade inspirada, ativa e consciente. Nenhum transe, inconsciência ou cessão passiva de meu próprio eu a qualquer entidade incor­pórea ou forças estranhas. Permanecendo consciente, captava a onda [de pensamento], registrava, escolhendo com pleno conhecimento, como a antena que capta porque quer sinto­nizar-se com a transmissora que conhece e quer livre­mente ouvir por relação voluntária de ressonância.”[9] Ou seja, ele confessa que podia “escolher livremente” aquilo que ressoava com o seu pensamento, cerceado pela forma como podia compreender e limitado pelos conhecimentos de sua época.

Convém nos atermos, no entanto, que toda mediunidade segue processo semelhante, ou seja, trata-se de uma junção de mentes, não sendo nunca uma transmissão pura e simples de uma mente a outra sem a preponderante interferência daquele que a recebe. A própria doutrina espírita nos deixa clara essa limitação do fenômeno mediúnico, que não deve nunca ser encarado como um processo exato, isento de erros. Além disso, os próprios Espíritos, por mais elevados que sejam, por se acharem em nosso plano terreno de manifestação, são entidades nada mais que humanas, sujeitas também a equívocos, não dominando com exatidão absoluta todo o saber do Universo. Isso torna os registros mediúnicos passíveis de erros, o que não reduz os seus valores. E isso também deveria impedir-nos de conferir às revelações psicográficas o caráter de infalibilidade, o que nos leva a reeditar no Espiritismo o mesmo cunho dogmático das religiões convencionais. Todos conhecemos as graves consequências desse nocivo dogmatismo, que termina por impor sérios prejuízos ao nosso avanço na conquista das verdades absolutas.

Assim, O Livro dos Médiuns, por exemplo, esclarece-nos que os médiuns só podem captar aquilo que está ao alcance de suas compreensões: “Quer dizer que tais ou quais médiuns podem compreender um pensamento em virtude do adiantamento deles, ao passo que, para outros, por não despertarem nenhuma lembrança, nenhum conhecimento que lhes dormitem no fundo do coração, ou do cérebro, esses mesmos pensamentos não lhes são perceptíveis” – explicam as entidades Erasto e Timóteo no cap. XIX da referida obra. André Luiz, no livro Mecanismos da Mediunidade, igualmente afirma: “O médium é um filtro que assimila somente aquilo a que se afeiçoa (...). A sintonia psíquica se expressa na capacidade conceitual e interpretativa do médium (...). Sua possível fidelidade depende da capacidade do circuito mediúnico.”

Por isso, O Livro dos Espíritos, assim como toda obra de caráter mediúnico, não deveria ser encarado como um repositório de verdades absolutas, isento de erros, cuja validade não pode ser questionada. Os próprios Espíritos que ditaram a obra deixaram claro na questão 18: “O véu se levanta a seus olhos à medida que o homem se depura; mas, para compreender certas coisas, são-lhe precisas faculdades que ele ainda não possui”. E, na questão 182, completaram: “Nós, os Espíritos, só podemos responder de acordo com o grau de adiantamento em que vos achais”[10].

Além disso é possível admitirmos que as entidades que nos acompanham de perto a caminhada estão também em evolução e não atingiram o ápice do saber absoluto. Por isso, afirmam-nos, com sinceridade, em A Gênese de Kardec: “Há questões que nós mesmos, espíritos amantes da ciência, não podemos aprofundar e sobre as quais não poderemos emitir senão opiniões pessoais, mais ou menos hipotéticas”[11]. Informação corroborada por Emmanuel, no cap. XVII de sua obra, Emmanuel: “Os desencarnados de minha esfera não se acham indenes, por enquanto, do socorro das hipóteses. A única certeza obtida é a da imortalidade da vida e, como não é possível observar a essência da sabedoria, sem iniciativas individuais e sem ardorosos trabalhos, discutimos e estudamos as nobres questões que, na Terra, preocupavam o nosso pensamento”[12].

Atestam essa hipótese muitos temas discutíveis encontrados no Pentateuco Kardequiano, que a própria evolução do pensamento espírita tratou de reconsiderar. Questões como o momento da união do Espírito ao corpo físico no seio uterino (Q. 354), a discussão inicial sobre quem seria Adão (Q.50 e 51), a afirmação de que existiriam civilizações materiais em todos os planetas do nosso Sistema Solar (Q.188)[13]. O último livro que Kardec escreveu em vida, A Gênese, do mesmo modo, demonstra-nos claramente que o seu pensamento estava aferido à visão de mundo do Século XIX. A obra não resiste a uma análise cuidadosa de muitos de seus informes, como por exemplo, os expostos no seu cap. VI, ditados pelo Espírito Galileu, deixando-nos claro que também a entidade igualmente estava limitada aos conceitos vigentes naquele século. Daí podermos identificar diversas impropriedades científicas, do ponto de vista da cosmologia moderna (por exemplo, a tese de que Lua teria um de seus lados mais pesado que o outro e por isso estaria sempre com a mesma face voltada para nós). O “Espírito” demonstra ainda ignorar conceitos fundamentais da Relatividade de Einstein e da Física Quântica que nasceriam logo a seguir no começo do Século XX[14]. É evidente que essas limitações eram pertinentes à mente do médium e em nada desmerecem ou invalidam a obra e a própria Doutrina Espírita em suas conceituações filosóficas e de grande alcance religioso.

Do mesmo modo, consideramos que A Grande Síntese de Ubaldi, a despeito de ser extraordinária na apresentação de novos e revolucionários conceitos sobre a fenomenologia universal, peca por conter erros que devemos imputar a Ubaldi e não às correntes de pensamentos que o nutriam com lampejos de elevadas compreensões. Ele contava com os dados que nutriam o seu psiquismo e estavam limitados pelo alcance de sua compreensão e pelo saber científico de sua época.

Por exemplo, não se conhecia até então o nêutron[15] e a escala periódica a que Ubaldi se referia apresentava erros referentes ao incompleto conhecimento daquele período. Por isso, ele se baseia no aumento progressivo de número de elétrons como fator determinante da caracterização dos elementos, como era corrente até então. Hoje sabemos que a escala tem por base, ao contrário, o número de prótons. Alguns conceitos de radioatividade também estão errados, claramente imputados à incompreensão do autor humano e não à fonte espiritual que o nutria. Some-se a isso alguns erros de tradução e temos em mãos uma obra que realmente não resiste ao mais simples escrutínio da ciência dos nossos dias, em muitos de seus aspectos.

Dessa forma, o trabalho será sempre discutível e passível de erros para quem se lhe aproxima unicamente com o intuito de negá-lo. Como nos afere Ubaldi, ele não é apreciável como “um fato externo”, mas é, antes, um fenômeno “íntimo, intrínseco”, somente aceito por quem está preparado para compreendê-lo.

Portanto, para que se possa usufruir da excelência de suas elevadas revelações, aproveitando-as para alavancar nossa emersão nos planos superiores do Espírito, faz-se necessário perdoar os equívocos das formas que vestem seus preceitos, atendo-nos unicamente ao desenvolvimento de seus preceitos, de elevado alcance filosófico e espiritual. E precisamos ainda desvestirmo-nos de sectarismos e preconceitos, pois, como afirma Ubaldi, somente com pureza de intenções se pode penetrar na vastidão de seus conceitos: “(...) e então sentireis em minha palavra a Verdade, sem pro­vas exterio­res, pelo seu tom e conteúdo”[16]. Se nos aproximarmos com a precípua intenção de especular e demolir, interessados única e premeditadamente na defesa de nosso exclusivismo, então permaneceremos detidos na vestidura, escapando-nos os seus fundamentos. Será inútil qualquer convencimento, pois não alcançaremos o significado profundo de seus elevados enunciados. A obra não será aproveitada, perdendo-se a sua imensa capacidade de nos trazer paz e sabedoria ao Espírito.

Ao exarar que sua palavra trazia a “Verdade”, Ubaldi não se vestia de rasgos de prepotência e alardes de orgulho, como muitos julgam. Ele apenas revelava, em sincera demonstração de humildade e submissão, sua incapacidade de duvidar da tempestade de conceitos a se precipitar em seu psiquismo, oriunda, seguramente, dos planos superiores do Espírito.

Em 1963, Pietro Ubaldi ofertou a sua obra ao Espiritismo, por meio de uma carta dirigida aos espíritas, reunidos no VI Congresso Pan-americano da entidade em Buenos Aires. Seu gentil oferecimento foi compreendido como uma ofensa à Doutrina Kardequiana, levando José Herculano Pires, então dirigente do evento, a redigir uma missiva negando formalmente a contribuição, além de criticar severamente a atitude do Missionário da Úmbria. O artigo, que assinalou o afastamento dos espíritas latinos da revelação ubaldiana, é citado por Fonseca, que o exalta como um seguro atestado de impropriedade do trabalho do Apóstolo de Gúbio[17], levado a termo com grande esforço, pesadas renúncias e um enorme desejo de fazer o bem para a humanidade. Remetemos o leitor interessado em conhecer e analisar melhor essa famosa carta ao site www.ubaldi.org[18], onde se acha publicado um texto que discute pormenorizadamente a polêmica elencada pelo chamado “Kardec brasileiro”.

III – Evangelho da Ciência

Em 1939, a primeira versão de A Grande Síntese em nosso idioma, traduzida do italiano por Guillon Ribeiro, foi publicada pela Federação Espírita Brasileira. Essa edição foi prefaciada por Emmanuel com o artigo intitulado “O Evangelho da Ciência”, psicografado por Chico Xavier em outubro de 1938, em Pedro Leopoldo, e que assim se expressa, em seus primeiros parágrafos: “Quando todos os valores da civilização do Ocidente desfalecem numa decadência dolorosa, é justo que saudemos uma luz como esta, que se desprende da grande voz silenciosa de A Grande Síntese. (...) A palavra do Cristo projeta nesta hora as suas irradiações enérgicas e suaves, movimentando todo um exército poderoso de mensageiros seus, dentro da oficina da evolução universal. (...) Aqui fala a Sua Voz divina e doce, austera e compassiva. No aparelhamento destas teses, que muitas vezes transcendem o idealismo contemporâneo, há o reflexo soberano da sua magnanimidade, da sua misericórdia e da sua sabedoria. Todos os departamentos da atividade humana são lembrados na sua exposição de inconcebível maravilha!” (os grifos são nossos).

O texto aconselha-nos, com sabedoria, a deixar de lado nossas questiúnculas para “colocar acima de todas as preocupações transitórias, as glórias sublimes e imperecíveis do Espírito imortal”. E encerra exaltando-nos a aproximar dos elevados conceitos semeados na obra: “Curvemo-nos diante da misericórdia do Mestre e agradeçamos de coração genuflexo a sua bondade. Acerquemo-nos deste altar da esperança e da sabedoria, onde a ciência e a fé se irmanam para Deus”.[19] (Os grifos são nossos).

Chico Xavier nunca deixou de exaltar o trabalho de Ubaldi nas mais diversas ocasiões. Em carta ao amigo Clovis Tavares ele declara: “Acredito profundamente que a mensagem de Pietro Ubaldi é a tradução do pensamento do nosso Divino Mestre para a inteligência do nosso século. Nosso devotado missionário é o instrumento de venerandas vozes, entre as quais se destaca Sua voz, a voz de nosso Amigo Celestial”.[20]

No famoso encontro ocorrido no dia 17 de agosto de 1951, em Pedro Leopoldo, entre Chico Xavier e Pietro Ubaldi, o grande médium mineiro recebe uma belíssima missiva da magna entidade Francisco de Assis dirigida ao místico italiano, chamando-o de “Pedro” e evocando-o a seguir no sublime postulado: “(...) Não tomes outra diretriz senão a de sempre (...). A voz Dele ressoará de novo na acústica de tua alma e as grandes palavras, que os séculos não apagaram, voltarão mais nítidas ao círculo de tua esperança, para que as tuas feridas se convertam em rosas e para que o teu cansaço se transubstancie em triunfo. O rebanho aflito e atormentado clama por refúgio e segurança. Que será da antiga Jerusalém humana sem o bordão providencial do pastor que espreita os movimentos do céu para a defesa do aprisco?” (o grifo é nosso).[21]

Não conhecemos até então alguém que tenha merecido receber diretamente do Santo de Assis uma mensagem particular senão Pietro Ubaldi, suscitando-nos tratar-se de alguém muito mais especial do que imaginamos. Fato que nos leva a corroborar a tese, vigente entre os seus estudiosos, de que Ubaldi era velho amigo e companheiro de ideal do Poverello da Úmbria. E assim muitos o identificaram como o Frei Leão, o companheiro mais íntimo do famoso Santo, que então retornava à ribalta terrena[22].

Fica claro, portanto, que, se negarmos validade à obra de Ubaldi, seremos forçados também a imputar erros na mediunidade e na avaliação pessoal de Chico Xavier ou mesmo contestar a idoneidade à entidade que o orientava, Emmanuel.

Esclarecemos, enfim, que Pietro Ubaldi não criou uma escola religiosa ou filosófica denominada “Ubaldismo”, a que muitos espíritas se referem. O Apóstolo de Gúbio insistiu com veemência durante a sua vida para que não se fomentasse nenhuma corrente, de qualquer natureza, particularizada em seu nome, fazendo questão de se apresentar como um universalista, não filiado a escola religiosa alguma. Com isso, muitos espíritas o rejeitam simplesmente pelo fato de que seu nome não está inscrito entre os aficionados da Doutrina dos Espíritos. Ora, as grandes realidades que sustentam a vida e o Universo não são patrimônio de religião alguma e não se faz necessário consorciar-se às fileiras do Espiritismo para se fazer porta-voz de verdades universais. A fenomenologia do universo não pode estar restrita a nenhuma doutrina em particular, encontrando-se à disposição de todos quantos se disponham a penetrar-lhe o âmago dos mistérios. E não se pode negar que grandes verdades estão espalhadas pelas mais diversas áreas do saber humano, inclusive, é claro, na ciência, e não podem ser desprezadas simplesmente porque não detêm o rótulo de espíritas. Portanto, não vemos necessidade alguma de que alguém se declare espírita para que seus ensinamentos adquiram o valor de verdades ou venham a merecer a atenção dos espíritas. Restringirmos o conhecimento da realidade ao âmbito do Espiritismo seria fecharmo-nos ao estreito círculo dos dogmas, repetindo o mesmo erro que sempre fomentou as religiões tradicionais em todos os tempos.

IV – Espírito, Energia e Matéria

Seguramente, a proposição mais fantástica dentre as revelações de A Grande Síntese é a chamada “Grande Equação da Substância”, na qual Ubaldi propõe a unificação entre Espírito, Energia e Matéria. Segundo esse conceito, esses elementos são tidos como etapas de um ciclo de transformações de uma essência imponderável a que se denomina substância. Um insight fantástico, delineado na obra em estudo, mas que Ubaldi revela-nos ter percebido tempos antes, ao caminhar pela praia de Falconara, no Mar Adriático, na Itália, descrevendo-a como uma visão relâmpago que o assaltou de inopino, como se partisse de uma abertura do firmamento. Estudando-a com atenção não apenas em A Grande Síntese, mas ao longo de toda a sua obra, não há como negar-lhe o profundo significado e a capacidade de explicar todos os fenômenos que nos envolvem, conferindo a nossa realidade um extraordinário sentido de unidade. Segundo essa estupenda ideia, tudo que existe provém de uma coisa só, conceito de relevante importância na atualidade denominado monismo, e que pode ser definido como a doutrina da unidade, buscada por muitos pensadores ao longo da nossa história. Pela defesa dessa primordial ideia, Ubaldi caracterizou-se, do ponto de vista filosófico, como o maior monista de todos os tempos.

Este artigo não se propõe a discutir essa fantástica tese, suas aplicações em nosso mundo e suas consequências em nossas vidas. Devemos nos ater nesse momento à afirmação, contidas no trabalho que estamos analisando, de que tal proposta não tem bases científicas na atualidade, o que não nos parece ser coerente com muitos informes que podemos colher da própria ciência hodierna.

Os espíritas, e não a Doutrina em si, admitem a existência de dois elementos distintos no Universo: Espírito e matéria, que se uniriam no processo de evolução, mas que seriam de naturezas diversas e inconciliáveis. Trata-se de um conceito vigente na época em que nascia o Espiritismo e que persiste, sobretudo nas grandes religiões ocidentais, como um legado do dualismo cartesiano do Século XIX. Portanto, o monismo era uma ideia prematura na ocasião, não admitida pelos médiuns que recebiam as mensagens das entidades superiores e que não seria igualmente aceita pela comunidade de então. Segundo o dualismo vigente, Deus teria criado um substrato à parte, distinto até mesmo de sua própria natureza, a matéria, para servir como um sustentáculo do Universo físico e um berço para a criação de Espíritos. No entanto, encontramos dificuldades de compreender como seria possível ao Criador gerar algo diferente de sua própria essência, uma vez que tudo só pode advir de Seu pensamento. Um paradoxo que o dualismo dificilmente resolverá. Acreditamos, ao contrário, que tudo advenha de uma substância única e divina, pois Deus só pode criar a partir de um único substrato, a substância de Seu pensamento.

No entanto, se analisarmos detidamente a questão 28 de O Livro dos Espíritos veremos que o dualismo fenomênico, na verdade, é uma interpretação dos seus seguidores e não da Doutrina em si. Diz a referida questão, ao tratar dos elementos gerais do Universo: “Um fato patente domina todas as hipóteses: vemos matéria destituída de inteligência e vemos um princípio inteligente que independe da matéria. A origem e a conexão destas duas coisas nos são desconhecidas. Se promanam ou não de uma só fonte; se há pontos de contacto entre ambas; se a inteligência tem existência própria, ou se é uma propriedade, um efeito; se é mesmo, conforme a opinião de alguns, uma emanação da Divindade, ignoramos. Elas se nos mostram como sendo distintas; daí o considerarmo-las formando os dois princípios constitutivos do Universo. Vemos acima de tudo isso uma inteligência que domina todas as outras, que as governa, que se distingue delas por atributos essenciais. A essa inteligência suprema é que chamamos Deus.”[24] (os grifos são nossos). Portanto, com muita sinceridade, a questão de identidade ou dessemelhança entre Espírito e Matéria não se firmou e permaneceu aberta na obra básica. Os espíritas, ventilados pela vigente interpretação cartesiana da realidade não se deram conta do fato e permaneceram aficionados ao dualismo fenomênico, o qual, na atualidade, não está mais resistindo ao avanço da própria ciência, sobretudo no âmbito da Física Quântica.

Constatamos também que o próprio Espiritismo evoluiu para o monismo mediante as revelações de Chico Xavier, espalhadas por várias de suas obras. No livro Emmanuel, por exemplo, encontramos no Cap. XXXIII a citação: “É lícito considerar-se espírito e matéria como estados diversos de uma essência imutável, chegando-se dessa forma a estabelecer a unidade substancial do Universo. Dentro, porém, desse monismo físico-psíquico, perfeitamente conciliável com a doutrina dualista, faz-se preciso considerar a matéria como o estado negativo e o espírito como o estado positivo dessa substância”.[25] (Grifos nossos).

Já no domínio da ciência moderna são inúmeros os cientistas que nos mostram o transformismo e a igualdade entre energia e matéria, de modo que nos estranha o fato de o eminente físico Alexandre da Fontes negar essa incontestável realidade, tão propalada nos dias atuais. Esse pesquisador afirmar-nos, no seu referido texto que “a energia total de um sistema, em qualquer processo físico, sempre se conserva, nem matéria se transforma em energia (...) nem energia se transforma em matéria (...). Energia não é, portanto, uma substância que pode se transformar em outras coisas, mas sim uma grandeza abstrata matemática que representa uma lei da natureza, a lei de conservação de energia”[26].

Entrementes, essa não é, seguramente, a opinião da maioria dos físicos de que temos notícias. O reconhecido físico brasileiro, Marcelo Gleiser, por exemplo, em um artigo intitulado “Matéria e Energia”, publicado na Folha de São Paulo, em 22/10/2006, e que se acha na obra Micro Macro 2[27], assim se expressa: “Einstein mostrou que energia não é apenas uma coisa que corpos podem ou não ter. Segundo a teoria da relatividade especial, matéria e energia são interconvertíveis: é possível transformar matéria (ou massa) em energia e vice-versa. Ou seja, em vez de ser algo que corpos materiais têm, energia passou a ser algo que eles são. Massa é energia e energia pode ser massa. A sutileza está em como ocorre essa transformação. (...) Existe algo de muito belo nessa nova física, onde matéria e energia são, essencialmente, a mesma coisa. Isso pode não ser aparente na nossa vida diária, mas está lá, no coração do átomo, regendo as interações entre as partículas elementares da matéria”. (O destaque é nosso).

Fritjof Capra, em seu famoso livro, O Tao da Física, declara, categoricamente: “A descoberta de que a massa é apenas uma modalidade de energia levou-nos a modificar de modo essencial nosso conceito de partícula. Na Física moderna, a massa deixou de ser associada a uma substância material, razão pela qual as partículas não são mais vistas como consistindo de um ‘estofo básico’, mas como pacotes de energia.”[28]

Stephen Hawking, talvez o físico de maior renome no nosso século até então, declara em sua última obra, Breves Respostas para Grandes Questões: “Einstein percebeu algo absurdamente extraordinário: que dois ingredientes principais na composição do universo – massa e energia – são basicamente a mesma coisa, dois lados da mesma moeda, se preferir. Sua famosa equação E=mc2 simplesmente quer dizer que a massa pode ser pensada como uma espécie de energia e vice-versa.”[29]. Conclusão corroborada pelo físico Carlo Rovelli que, em uma de suas obras, considera: “Einstein se deu conta de que energia e massa são duas faces de uma mesma entidade (...) uma pode se transformar na outra”.[30]

Esse fato é facilmente comprovado nos aceleradores de partículas, nos quais se verifica a transformação da massa de partículas em energia e vice-versa, o que pode ser atestado por qualquer físico. Robert Gilmore, na sua obra Alice no País do Quantum, reafirma: “Partículas podem ser criadas em processos de colisão, a energia cinética das partículas que colide sendo convertidas para produzir energia da massa de repouso das novas partículas”.[31]

O resultado da interação entre um próton, um elétron e um pósitron, sabidamente, consiste em um próton e um fóton, demonstrando-nos que o excedente da soma das massas dos componentes iniciais se converteu em uma parcela de pura energia, o fóton. Reação que admite o caminho inverso, ou seja, um próton e um fóton podem gerar outro próton, um elétron e um pósitron – assim, de igual modo, a soma final das massas dessas partículas supera seus pesos iniciais, comprovando-se a conversão de energia em matéria.

Outro exemplo muito citado desse transformismo massa/energia refere-se às reações nucleares no interior do Sol. A ciência nos atesta que quatro núcleos de hidrogênio são fundidos na fornalha atômica solar para gerar um núcleo de hélio. No entanto, como o peso final desse produto é menor do que a soma dos iniciais, o excedente em massa se converte nas energias solares que são irradiadas para o espaço.

Quando partículas se chocam com suas respectivas antipartículas suas massas são transformadas em enorme quantidade de energia. Um nêutron ao se desintegrar em um próton e um elétron deixa uma energia excedente que sabidamente se converte na massa de um neutrino[32]. São reações conhecidas e comumente citadas em obras de renomados autores de Física Quântica da atualidade, de modo que a conservação de energia enunciada pela termodinâmica mantém-se, porém somente se considerarmos o equivalente de transformação massa/energia, como proposto pela famosa fórmula de Einstein (E=mc2).

Desse modo, torna-se praticamente impossível negar a transformação de massa em energia e vice-versa. Transformismo que impera como fato incontestável em nosso Universo e que podemos ver no próprio comportamento dual das partículas atômicas que são ao mesmo tempo matéria e onda. E onda não é outra coisa senão uma manifestação de pura energia.

Já o transformismo e a igualdade entre os três elementos fundamentais do Universo, matéria, energia e Espírito, embora ainda não comprovado, também dificilmente poderá ser negado pela ciência moderna e sequer pelo Espiritismo. Desde que os experimentos da Física Quântica demonstraram a preponderante interferência do observador nos resultados de suas aferições, a consciência tem sido evocada como o elemento interativo entre o universo macroscópico e o mundo interatômico por ser, possivelmente, de mesma natureza deste, caminhando-se assim para uma igualdade entre os três elementos.

Autores de livro de Física Quântica destacam o marcante e inegável paralelo entre os fenômenos da consciência e o comportamento das partículas quânticas, em decorrência da interferência do livre-arbítrio e da percepção do tempo do observador nas aferições experimentais. Desse modo, muitos pesquisadores já consideram que a consciência, nada mais que outro nome para “Espírito”, não apenas participa do fenômeno quântico, mas seria algo capaz mesmo de produzi-lo. Fato suscitado pelos experimentos quânticos desde os primórdios do nascimento da Física das partículas elementares, pois o pai da Mecânica Quântica, Max Planck, chegou a vislumbrar essa realidade ao exarar: “Vejo a matéria com um derivado da consciência.”[33]

Vários pesquisadores que participaram do desenvolvimento da Física Quântica ressaltaram não só a preponderante interferência da consciência no fenômeno quântico, mas a impressão de tratar-se de dois domínios de mesma natureza. Por isso, os físicos norte-americanos Bruce Rosenblum e Fred Kuttner escreveram uma obra, O Enigma Quântico, para demonstrar o inevitável encontro da Física moderna com a consciência, suscitado pelo integrante “problema da medição” que permeia todo experimento quântico. E citam uma afirmativa de Andrei Linde, físico da Universidade de Stanford: “Acabará por se revelar, com o desenvolvimento adicional da ciência, que o estudo do Universo e o estudo da consciência estão inseparavelmente ligados, e que o progresso definitivo de um campo será impossível sem o progresso do outro (...) será o próximo passo importante do desenvolvimento de uma abordagem unificada para nosso mundo inteiro, que incluirá o mundo da consciência”.[34] (O grifo é nosso).

Não tardará e chegaremos ao monismo pelos veículos do próprio empirismo científico, pois atualmente encontramos inúmeras referências de diversos pesquisadores modernos aferindo-nos a união entre o Espírito, a Energia e a Matéria, como prenunciado pela revelação de Ubaldi. Amit Gusvami, por exemplo, reconhecido físico quântico da atualidade e autor de diversos livros, declara, em sua obra A Física da Alma[35]: “A ciência moderna tem dado apoio a uma visão monista de mundo – a de que existe apenas uma substância a formar a realidade. Com razão, ela evita o dualismo da interação (um legado de René Descartes) em nosso modo de ver a realidade; dualismo e ciência quântica são como óleo e água, não se misturam”.

David Bohm, outra celebridade da ciência atual, no seu livro Totalidade e a Ordem Implicada, afirma: “A teoria quântica e a da relatividade concordam, no ponto em que ambas indicam a necessidade de se ver o mundo como uma totalidade indivisível, que todas as partes do Universo, incluindo o observador e seus instrumentos, se fundem e se unem em uma totalidade” (o grifo é do próprio autor). Nessa obra esse famoso físico expõe com clareza a sua fundamentada tese de que todos os objetos fenomênicos de que se compõe a nossa realidade não só estão fundidos em indissolúvel unicidade, mas admitem também impreteríveis critérios de identidade. Fato que o leva a concluir: “Nesse fluxo, a mente e a matéria não são substâncias separadas. Ao contrário, elas são aspectos diferentes de um movimento único e completo”[36] (aqui o grifo é nosso).

Se ainda duvidamos do transformismo Espírito, energia e matéria, basta considerarmos que experimentamos em nós mesmo uma paulatina dilatação da consciência, demonstrando-nos que a evolução, em sua maravilhosa alquimia, trabalha para converter os valores da vida física (matéria e energia) em consciência pura. Nosso quilate de consciência, a expressar-se em inteligência e outros atributos imponderáveis do Espírito, é hoje muito maior do que nos milênios que antecederam a nossa caminhada. A matéria orgânica que nos integra como um composto de massa e energia está se sutilizando e progressivamente se desfazendo em um movimento que, em sua essência, sintetiza o paulatino engrandecimento da consciência, no processo de construção de nós mesmos a que todos estamos afeitos. Faz-se evidente assim que o Espírito está sendo edificado pela Sabedoria Divina por meio do transformismo matéria-energia-Espírito.

Desse modo, se negarmos a interação entre os três elementos que nos constituem e que só se pode fazer em base a critérios de identidade, estaremos negando o nosso próprio desenvolvimento. Por isso, todo o Universo conspira para a produção de consciência, sua flor mais preciosa e objetivo único do processo criativo ínsito na natureza. Assim é que Emmanuel afirma-nos, em sua obra O Consolador, que tudo que existe é manifestação de uma essência única que “no mineral é atração, no vegetal é sensação, no animal é instinto, no homem é razão e no anjo é divindade”[37]. Temos aí o que chamamos de “espectro contínuo da consciência”, que se inicia no cerne atômico e termina na angelitude, corroborando-se o que nos afirma a questão 540 de O Livro dos Espíritos ao declarar que o “o arcanjo começou por ser átomo” [38] (o grifo é nosso). Ou seja, podemos inferir que o Espírito iniciou sua manifestação no plano físico fazendo-se matéria e, como consequência dessa afirmativa, podemos considerar a matéria bruta como criação e expressão do Espírito.

Logo, é forçoso admitirmos que o Espírito é a base de todo o processo evolutivo e de toda manifestação de formas em nosso Universo. Dele parte um fluxo criativo que se move em forma de dinamismo, a energia, para se realizar no mundo concreto, a matéria, comprovando-se o monismo universal. “O verbo se fez carne”, anuncia o famoso prólogo do Evangelho de João (1:14), corroborando o evidente transformismo energia/matéria que permeia todo o Universo.

Na obra Nos Domínios da Mediunidade, de autoria de André Luiz e psicografia de Chico Xavier, encontramos inúmeras referências a esse unicismo fenomênico: “Dos fluidos que nos integram o clima de manifestação, todos eles são de origem mental (...). Toda matéria é energia tornada visível e toda energia, originariamente, é força divina de que nos apropriamos para interpor os nossos propósitos aos propósitos da Criação. (...) “Tudo é Espírito no santuário da Natureza.” [39] (Os grifos são nossos).

Portanto, negar a inter-relação e a similitude entre os três elementos básicos da realidade, Espírito, energia e matéria, parece-nos, na atualidade, uma espécie de suicídio intelectual por ir contra tudo que as grandes doutrinas espiritualistas nos afirmam e o próprio empirismo científico vem nos demonstrando. Tampouco, parece-nos sensato recusá-lo em nome de uma pretensa “pureza doutrinária” que alimenta as fileiras espíritas, e que, se é um movimento justo e digno na defesa de sua coerência, será também capaz de cerceá-la em estreito dogmatismo, como aconteceu com todas as religiões do passado.

V – Urânio, Radioatividade e Densidade

Como já afirmamos, Ubaldi não conhecia detalhes do fenômeno da radioatividade como o conhecemos hoje. Não só pela limitação da época, como também pela insuficiência de seu conhecimento. Então, era natural que ele, ao captar a corrente noúrica, a tenha interpretado com o seu próprio e insuficiente entendimento. Assim, ele, e não a entidade propriamente dita, entendeu como sendo pertinente à radioatividade o processo de produção de energia que ocorre no Sol. Admitimos o seu erro, compreendemos, porém, que o grande místico intuía a existência de um princípio geral de funcionamento da mecânica universal, de imenso valor para o nosso entendimento: a atuação de duas forças preponderantes, uma de contenção e construção e outra de expansão e dispersão. Ao primeiro impulso se consorciam todos os fenômenos de formação de massa e ao segundo, os de desfazimento e morte, como o é a radioatividade. Embora o Sol não esteja se desfazendo por radioatividade propriamente dito, nele podemos ver essas duas forças prototípicas em ação: a contração, na compactação de seu estoque de hidrogênio em núcleos atômicos pesados, e a expansão, no decaimento de parte de sua massa desfazendo-se em energias irradiantes[40].

Com respeito à “densidade”, sabemos, efetivamente, que a radioatividade de um material não se deve propriamente a essa propriedade da matéria. Essa palavra foi empregada por Ubaldi não em sua conceituação habitual, definida como o quociente entre a massa e o volume de um corpo, mas com o significado de aumento do peso atômico de uma substância. E, de fato, encontraremos o fenômeno da radioatividade comumente entre os elementos mais pesados da tabela periódica (e não propriamente nos mais densos), embora possa também ser identificada em escalas de menores números atômicos, como o carbono 14, citado no trabalho que estamos analisando. De qualquer forma, existe um limiar de compactação da matéria (que pode ser atingido mesmo fora dos limites dos pesos atômicos máximos) a partir do qual a matéria sofre um natural desfazimento de sua conformação, para então começar a desfazer-se em irradiações. Esse limiar é que Ubaldi chama de densidade.

Logo, o princípio geral anunciando em A Grande Síntese é comprovado, pois não se pode negar que a matéria, como manifestação dos elementos em nosso Universo, nasce na forma mais simples, o átomo de hidrogênio, cresce em peso atômico no movimento de concentração de massa, até os limites nos elementos pesados, para então se desfazer no movimento contrário de expansão, decaindo então, ou seja, “morrendo” através da radiatividade. É o mesmo movimento duplo que se verifica no nascimento e morte das estrelas, e o mesmo que embala os seres vivos, na contração que antecede ao renascimento, reverberando logo a seguir na expansão do crescimento físico até a sua extinção por nova contração, levando à morte orgânica. Movimentos que identificamos na própria gênese do Universo, que partiu da condensação de forças fundamentais e sua subsequente expansão, compreendida hoje como um rebote, denominado Big Bounce pelas modernas teses da gravidade quântica em loop[41].

Se nos fixarmos unicamente à forma, seguramente, encontraremos outras impropriedades na famosa obra de Ubaldi. Por exemplo, o valor 2,085x10-6/seg, referido como a taxa de transformação da radioatividade, é um mistério e não sabemos de onde o autor o retirou. Aqui, mais uma vez, compreendemos que “Sua Voz” lhe transmitia conceitos e não valores exatos. A própria mente de Ubaldi é que os convertia em dados objetivos e, dessa forma, o místico da Úmbria encontrou a referência a esse valor em alguma publicação de sua época. Mas é inútil pesquisar, não se acha em nenhum lugar esse número, apenas em A Grande Síntese. O que sabemos na atualidade é que a chamada “constante radioativa” não tem um valor fixo, como indicado no livro, e varia de acordo com cada elemento.

Há um outro lapso, comentado por alguns pesquisadores mais perspicazes, no cap. 18, com respeito à afirmação de que “uma transformação alfa é compensada por uma transformação beta”[42] enquanto, na verdade, é compensada por duas transformações betas. Aqui se trata de erro de tradução, uma vez que no original podemos ler: “una trasformazione α può essere compensata da due trasformazioni β in senso contrario[43]. Esse erro encontra-se em todas as publicações antigas da obra até a sua 19ª edição, do Instituto Pietro Ubaldi, e só foi corrigido em versões posteriores.

VI – Órbita dos Planetas

Concordamos com Alexandre da Fonseca com respeito à informação contida no cap. XXXII da obra em discussão, pois não nos parece viável considerar que “os planetas (...) recairiam sobre o Sol se não estivessem se desagregando por efeito da radioatividade”. Certamente, trata-se de um equívoco interpretativo de Ubaldi, ao captar a corrente noúrica que o assistia ou um erro na aplicação do termo “radioatividade”. Deslize perdoável, ante a profusão e a importância de acertados conceitos introduzidos pela obra.

Talvez Ubaldi estivesse se referindo aqui a outro fenômeno, a desagregação da matéria que ocorreria de forma natural, sem implicar na desintegração radioativa propriamente dita. Toda matéria está sujeita a um decaimento espontâneo que a levará ao paulatino desfazimento e morte, com a restituição de seu substrato dinâmico ao manancial energético do Cosmos. A isso Ubaldi chamou erroneamente de “radioatividade” e hoje denominaríamos de “decaimento”. Compreendemos com Ubaldi que a matéria é uma construção instável, sujeita a um duplo movimento de contenção e dispersão, o qual lhe impõe uma paulatina morte por desagregação de seus elementos. Embora não definido claramente pela ciência atual, esse impulso desagregante, de caráter expansivo, impera sobre todos os objetos fenomênicos existentes, contrapondo-se à natural força contrativa que os conformou. Ele promoverá o lento decaimento dos átomos, mesmo os compostos não radiativos. Assim, é bem possível, como alguns pesquisadores já se deram conta, que até o próton, em sua aparente e inviolável estabilidade, deverá se desmantelar no distante horizonte da morte do Universo físico, por essa força expansiva, que terminaria por atingir e desfazer até mesmo o cerne atômico.

É bom provável que essa força desagregante corresponda ao impulso de expansão do espaço, hoje denominado campo escalar ou inflaton, responsável pelo fenômeno de recessão das galáxias[44]. Essa poderosa força infla tudo que existe, antepondo-se à contração gravitacional, de forma a impedir o colapso do Cosmos. Assim sendo, é possível que esse campo antigravitacional se irradie de toda matéria existente, atuando em torno de toda concentração de massas, e não unicamente nas amplitudes siderais, onde já foi identificado. Portanto, os planetas igualmente poderiam irradiá-lo, de forma a compensar a atração gravitacional dos sóis em torno dos quais orbitam, aferindo-se assim a revelação de Ubaldi. Como seu efeito é reduzidíssimo nessa pequena escala cósmica, não poderia ser demonstrado pelas aferições da gravitação universal newtoniana. Naturalmente que estamos aqui postulando uma mera hipótese, não passível de comprovação no momento, podendo mesmo estar destituída de qualquer fundamento. Apenas elucubramos que os conhecimentos atuais da ciência não atingiram as explicações últimas de todos os fenômenos em que estamos imersos, não nos sendo conveniente a posição de detentores de verdades absolutas. A história está repleta de pretensiosas afirmações ditas científicas que mais tarde foram desmentidas.

VII – Combustível das estrelas e desagregação do Sol

Temos de concordar também com Fonseca ao apontar o erro de se considerar o Sol, assim como os planetas, um corpo que “se desintegra por radioatividade”. Acreditamos que Ubaldi referia-se apenas ao fato de que o Astro Rei consome a sua matéria à medida que a irradia em forma de luz e calor para o espaço ao derredor. E de fato, embora se trate de uma fusão e não uma fissão nuclear, não há dúvida de que o Sol está “queimando” seu aporte de hidrogênio, e terminará por morrer ao findar seu material de combustão. Possivelmente Ubaldi nada mais fez que utilizar-se de um termo que lhe era familiar, a “radioatividade”, para vestir em palavras, mais uma vez, o conceito de decaimento da matéria, que “Sua Voz” lhe intuía ao psiquismo.

De qualquer modo, é inegável que a intuição nesse momento lhe ditava existir no interior do Sol reações de natureza termonucleares, para as quais ele não encontrou outra denominação senão a “radioatividade”, desde que ele não conhecia o fenômeno da fusão nuclear. E ele entendia a irradiação solar com o mesmo critério geral do equilíbrio entre forças contrativas e expansivas que a tudo permeia no Cosmos, como já nos referimos, conferindo-lhe o errôneo nome de “radioatividade”, simplesmente por ser uma “irradiação” de energias e partículas. Portanto, desvestido da forma, trata-se de uma referência ao mesmo duplo fenômeno de contração e expansão que impera no Cosmo: o Sol nasce pela contração gravitacional das massas de hidrogênio e sofre uma subsequente expansão em forma de irradiações de diversos quilates, para terminar sua vida em explosões e desagregações finais[45]. Portanto, não se trata, naturalmente, da radioatividade como hoje a conhecemos, porém de um fenômeno de mesma natureza desta, ou seja, de dispersão e morte de uma estrela com a dissipação de sua matéria constitutiva.

Com respeito à inversão entre o hélio e o hidrogênio na composição das estrelas, realmente, não se pode defender a afirmativa de Ubaldi, tratando-se, sem dúvida, de uma momentânea desatenção do autor. Em diversas outras citações da mesma obra, Ubaldi deixa-nos claro ser o hidrogênio o elemento fundamental da matéria universal, a partir do qual toda a subsequente escala estequiogênica dos elementos se desenvolve. “A mais simples expressão da matéria”, relata-nos, definindo o hidrogênio como a “forma primitiva de matéria, derivada por condensação (concentração) das formas dinâmicas”. E o confirma como o elemento constitutivo dos corpos jovens: “Vimos que o hidrogênio é o elemento constitutivo dos corpos jovens: nebulosas, estrelas brancas, quentes (...)”[46]. Portanto, concluímos que se trata de um deslize do autor humano, o qual, por um natural momento de distração, registrou invertida a informação que já se achava muito bem estabelecida em outros momentos da obra. Erro perdoável ante a excelsitude dos conceitos ventilados, em nada destituindo o valor das revelações em seu conjunto.

VIII – Éter

O controvertido éter, que caracterizava todas as afirmações místicas e mesmo científicas do Século XIX, foi inicialmente proposto como um substrato a preencher todo o espaço sideral, sendo o meio de que se serviria a luz para se propagar pelos caminhos do infinito. Foi defendido sobretudo por Descartes que o concebeu como uma força a estufar todo o Cosmos, sustentando e movendo os corpos celestes, que seriam assim carreados como rolhas flutuantes em um rio. A despeito de ter sido severamente combatido pela ciência do Século XX, permanece integrando a Doutrina Espírita, definido como o “fluido cósmico universal”, a fonte primária de todos os corpos densos e o liame que permitiria a união entre o Espírito e a matéria. Em A Gênese, Kardec afirma: “Há um fluido etéreo que enche o espaço e penetra os corpos. Esse fluido é o éter ou matéria cósmica primitiva, geradora do mundo e dos seres”[47] – o grifo é nosso.

Nada nos impede de resgatar esse antigo conceito como sendo um substrato diáfano a preencher todo o aparente vazio sideral. Segundo a cosmologia moderna, a matéria visível de que se compõe o Cosmos tem sua maior parte, cerca de 3.6% de um total de 4%, em forma de partículas livres, dispersas pelos espaços siderais[48]. Exatamente, essa contraparte poderia ser compreendida como “a matéria cósmica primitiva”, referida em A Gênese de Kardec, ou o éter cósmico, mencionado por Ubaldi.

Portanto, poderíamos perfeitamente caracterizar o “éter cósmico” como a matéria dispersa pelos vazios siderais e constituída de partículas atômicas livres, dentre as quais as mais pesadas seriam prótons. A questão permanece aberta e não temos ainda conhecimentos suficientes para comprovar ou mesmo negar essa revelação. A bem da verdade, a chamada matéria escura (que representa 23% da totalidade do Universo) poderia melhor corresponder ao fluido cósmico universal apregoado pelo Espiritismo ou o éter cósmico de Ubaldi. Alguns a identificam como a energia escura, por esta compor a maior parte da totalidade do Cosmos, 73%. No entanto, esse componente é essencialmente expansivo, sendo o responsável pela dilatação do Universo. A Doutrina Espírita, pelo contrário, ao caracterizá-lo como o precursor de toda a matéria existente, confere-lhe um caráter essencialmente contrativo, cabendo-lhe assim maior identificação com a matéria escura, por ela estar dotada de vigoroso pulso gravitacional. Aguardemos melhores esclarecimentos para nos iluminar a compreensão e colocarmos um fim às polêmicas que ainda permeiam o intrigante tema. Só não podemos negá-lo, pois negaríamos também um dos mais importantes fundamentos da Doutrina Kardequiana.

IX – Hereditariedade e DNA

A hereditariedade seria “um fenômeno puramente material”, como afirma o texto em discussão? Ele se embasa em algumas afirmações do cientificismo materialista, o qual nos induz a crer que o código genético seria suficiente para explicar a imensa complexidade dos seres vivos, dispensando qualquer interferência extrafísica. E, como espírita, cita a questão 207 de O Livro dos Espíritos, na qual as entidades afirmam que a “o corpo deriva do corpo”, sugerindo-nos que a herança física independeria do Espírito. No entanto, não nos parece ser a ideia que permeia os conceitos subsequentes da mesma obra, pois na questão 271 podemos ler: “Entretanto, o Espírito se reflete no corpo. (...) Sem dúvida que este é unicamente matéria, porém, nada obstante, se modela pelas capacidades do Espírito (...)”[49]

Portanto, parece-nos impróprio considerar que a matéria orgânica é regida nada mais que pelas suas inerentes leis, independentes do Espírito, raciocínio pertinente ao antigo dualismo separatista cartesiano. Preferimos acreditar que o próprio código genômico, com suas intricadas cadeias carreadoras de preciosas informações, é uma construção do Espírito, sob a orientação divina, a fim de permitir a continuidade da vida no planeta. Seria este nada mais que um chip biológico onde o Ser Eterno deixa gravado os informes necessários à confecção de sua futura massa orgânica. Não se poderia, assim, entregar a intricada e sábia formação de corpos ao comando de meras cadeias atômicas, que não poderiam ter gerado a si próprias de forma aleatória. Não seriam capazes de deter inteligência por si mesmas, sem a preponderante atuação do Espírito. Portanto, a hereditariedade, em última análise, seria psíquica ou espiritual, como o afirma Ubaldi. Não temos outra forma de compreendê-la. Assim, todos herdamos de nós mesmos na grande oficina de corpos em que se constitui a vida. E a complexidade da herança está, na verdade, entregue ao chamado “psiquismo diretor” e não a pretensos comandos de átomos de carbono, hidrogênio, oxigênio e nitrogênio, além de poucos outros microelementos, como o fósforo, os quais não detêm inteligência para se ordenarem por si sós na sábia complexidade do DNA.

A própria ciência já tem se dado conta do fato, ao constatar que todas as espécies da Terra usam genes em tudo similares. A distinção genética entre seres humanos, vermes e ratos é mínima e a semelhança é quase absoluta entre o nosso genoma e o dos macacos, sendo da ordem de 99.4%, segundo os pesquisadores. Tal imensa similaridade não seria suficiente para explicar as tamanhas diferenças que caracterizam todas as espécies vivas a habitar o nosso orbe.

Hoje já se sabe que, embora o número de genes existentes na fita de DNA seja imenso, poucos estão ativos. Cerca de 33.000 pares de genes têm ação em nossa cadeia genômica, transportando de célula para célula o desenho de 33.000 moldes proteicos. Número insuficiente para se formar um ser vivo completo. Nosso organismo, por exemplo, constrói mais de 3 milhões de proteínas distintas e necessárias ao seu funcionamento. A engenharia genética não sabe de onde vêm esses moldes proteicos, chamados de “proteomas”, em seu conjunto e só podemos remetê-los à sabedoria do Espírito. Em decorrência disso, constata-se que a fita de DNA nada mais é que um rascunho que detém modelos de proteínas fundamentais para que o Espírito, o verdadeiro arquiteto da vida, edifique o seu futuro organismo segundo seus profundos e inacessíveis conhecimentos, auferidos na longa experiência reencarnatória e sob a orientação divina que a todos assiste. Foi exatamente essa constatação que levou Francis Collins, chefe do Projeto Genoma Humano, a declarar que: “A complexidade do ser humano surgiu de alguma outra fonte, pela qual devemos agora começar a procurar.”[50] Não guardamos dúvida de que tal “complexidade” reside no psiquismo profundo e sábio do Ser Eterno, como o afirmou Ubaldi.

X – Conclusões

Chegamos assim à conclusão de que são temerárias e improcedentes as afirmações contidas em “Uma análise científica de algumas afirmações de A Grande Síntese”. Parte dos erros apontados se justificam, mas são poucos e perdoáveis, não comprometendo a valiosa obra de Pietro Ubaldi.

Lastimamos que o parecer negativo enfatizado no trabalho, respaldado seguramente em sólida formação científica, venha influenciando muitos estudiosos a se posicionar contra as revelações de Ubaldi, afastando-os dos inquestionáveis benefícios que suas revelações nos proporcionam. Não negamos que a Doutrina Espírita tenha nos fornecido “respostas mais sólidas, profundas e justas a essas e muitas questões fundamentais sobre a vida e os seres”[51], mas não podemos admitir que ela tenha nos proporcionado todas as verdades de que necessitamos em nossa caminhada, uma vez que muitos de seus informes achavam-se restritos à capacidade de entendimentos dos médiuns que a veicularam, detidos na incompleta visão de mundo do Século XIX. Uma doutrina essencialmente progressista, como nos pediu Kardec, deveria examinar com imparcialidade todas as verdades, mesmo aquelas que não nasceram em suas próprias fontes. Estejamos, portanto, atentos ao importante alerta que o Mestre de Lion nos deixou exarado em sua obra A Gênese: “Caminhando de par com o progresso, o Espiritismo jamais será ultrapassado, porque, se novas descobertas lhe demonstrassem estar em erro acerca de um ponto qualquer, ele se modificaria nesse ponto. Se uma verdade nova se revelar, ele a aceitará.”[52]

Seus seguidores, no entanto, em nome de uma “pretensa pureza doutrinária”, têm se mostrado resistentes à aceitação de qualquer progresso que pareça contrariar os seus fundamentos, o que terminará por cercear a magna doutrina em lastimáveis dogmas, como aconteceu com as demais religiões, presas até hoje no bolor do tempo.

Por tudo isso, permanecemos concordando com Chico Xavier e Emmanuel: a mensagem veiculada em A Grande Síntese tem todos os quesitos necessários para ser caracterizada como o “Evangelho da Ciência”, a despeito de seus poucos e justificáveis enganos. Ante a excelsitude e o volume de conceitos veiculados na obra e o esforço do autor humano em captar com a máxima fidelidade possível a elevada corrente intuitiva que o nutria, perdoamos seus deslizes, que não desmerecem o seu imenso valor e tem cumprido o seu papel de acelerar os nossos passos rumo aos patamares superiores do Espírito.

Nova Lima, primavera de 2019,

Gilson Freire

Nota: agradeço a Jô Drumond pela correção e sugestões a este artigo.

 

[1] A. F. Fonseca, “Uma Análise científica de algumas afirmações de A Grande Síntese”, Jornal de Estudos Espíritas 2, artigo 010203 (2014). http://www.espiritualidades.com.br/Artigos/F_autores_FONSECA_Alexandre_textos/FONSECA_Alexandre_tit_Uma_analise_cientifica_A_Grande_Sintese.htm

 [2] Formado em Física pela UNICAMP, em 1995, com Mestrado (1998) e Doutorado (2002) em Física pelo Pro-grama de Pós-Graduação do IFGW. Realizou estágio de pós-doutoramento no Instituto de Física da USP (2002-2006), no Alan G. MacGiarmid NanoTech Institute (2007-2008) e no Department of Materials Science and Engineering (2008-2009) na University of Texas at Dallas. Atualmente, é Prof. Doutor no Departamento de Física Aplicada do IFGW/UNICAMP, em Campinas, SP – informes copiados do site https://sites.ifi.unicamp.br/afonseca/?page_id=105m, consultado em 22 de setembro de 2019.

[3] Tenho formação em Medicina, pela Universidade Federal de Minas Gerais, em 1980, e especialização em homeopatia pela Escuela Médica Homeopática Argentina, em 1982. Iniciei curso de Física, também na UFMG, em 1973, porém desisti dois anos depois para ingressar em Medicina, por julgar que este deveria ser o meu caminho nesta vida. Dirijo o leitor para o site www.gilsonfreire.med.br caso deseje conhecer melhor meus trabalhos.

[4] Região central da Itália onde nasceu e viveu Pietro Ubaldi e onde está a histórica cidade de Assis.

[5] P. Ubaldi, Grandes Mensagens, p. 342. Instituto Pietro Ubaldi, Campos dos Goytacazes (2012).

[6] P. Ubaldi, As Noúres, Técnica e Recepção de Correntes de Pensamento, 3ª edição, cap. II, Instituto Pietro Ubaldi, Campos dos Goytacazes (1983).

[7] P. Ubaldi, Grandes Mensagens, cap. XVI. Instituto Pietro Ubaldi, Campos dos Goytacazes (2012).

[8] P. Ubaldi, As Noúres, Técnica e Recepção de Correntes de Pensamento, 3ª edição, Instituto Pietro Ubaldi, Campos dos Goytacazes (1983).

[9] P. Ubaldi, Problemas do Futuro, 3ª edição, Fundapu, Rio de Janeiro (1983).

[10] A. Kardec, O Livro dos Espíritos, Editora FEB, 79ª edição, Brasília-DF (1997).

[11] A. Kardec, A Gênese, Ed. FEB, 17ª edição, Rio de Janeiro (1975).

[12] Emmanuel, psicografia de F. C. Xavier, Emmanuel, cap. XXXIII, Editora FEB, 7ª edição, Rio de Janeiro (1970).

[13] Não parece viável a existência de civilizações físicas nos planetas de nosso sistema solar, sobretudo Marte, como afirmaram vários comunicados mediúnicos citados por Kardec. Se existem, não estão no plano físico, seguramente.

[14] Compreendemos que não é correto dizer que o “Espírito ignorava essa realidade”, pois, por mais que ele soubesse, não lhe seria possível transmitir uma ideia que não podia ser reconhecida pelo médium.

[15] O nêutron foi descoberto em 1932 pelo físico inglês James Chadwick, quando A Grande Síntese começava a ser escrita.

[16] P Ubaldi, A Grande Síntese¸ tradução de Carlos Torres Pastorino, 19ª Edição, Instituto Pietro Ubaldi, Campos dos Goytacazes (1997).

[17] Pietro Ubaldi viveu grande parte de sua vida na cidade italiana de Gúbio, por isso lhe é reservada essa alcunha.

[18] http://www.ubaldibh.org/index.php/mais-artigos-sobre-a-obra-de-ubaldi/carta-aberta-em-defesa-de-ubaldi.

[19] A mensagem completa pode ser lida em: http://www.ubaldibh.org/index.php/artigos/a-grande-sintese-apresentacao-de-emmanuel

[20] A carta completa pode ser lida em http://www.ubaldibh.org/index.php/artigos/carta-de-chico-xavier

[21] A mensagem na íntegra pode ser lida em: http://www.ubaldibh.org/index.php/artigos/mensagem-de-francisco-de-assis

[22] Essa informação encontra-se na obra Francisco de Assis, do Espírito Miramez e psicografia de João Nunes Maia, publicada pela Editora Espírita Cristã Fonte Viva, em 1985, em Belo Horizonte.

[24] A. Kardec, O Livro dos Espíritos, Editora FEB, 79ª edição, Brasília-DF (1997).

[25] Emmanuel, psicografia de F. C. Xavier, Emmanuel, cap. XXXIII, Ed. FEB, 7ª edição, Rio de Janeiro (1970).

[26] A. F. Fonseca, “Uma Análise científica de algumas afirmações de A Grande Síntese”, Jornal de Estudos Espíritas 2, artigo 010203 (2014), pág. 2.

[27] M. Gleiser, Micro Macro 2, pág 181, Ed. Publifolha, São Paulo (2007).

[28] F. Capra, O Tao da Física, pág. 155, Editora Cultrix, São Paulo (1983).

[29] S Hawking, Breves Respostas para Grandes Questões, tradução de Cássio de Arantes Leite, pág. 54, Editora Intrínseca, Rio de Janeiro (2018).

[30] C. Rovelli, A realidade não é o que parece, tradução de Silvana Cobucci Leite, 1ª edição, pág. 76, Editora Schwarcz, Rio de Janeiro (2017).

[31] R. Gilmore, Alice no País do Quantum, tradução de André Penido, pág. 155, Jorge Zahar Editor Ltda, Rio de Janeiro (1998).

[32] Embora exígua, o neutrino exibe uma massa, conforme facilmente se constata em anais científicos atuais.

[33] Citado em 50 Ideias de Física Quântica, de Joanne Baker, 7ª impressão, pág. 206, Editora Planeta do Brasil, São Paulo (2016).

[34] B. Rosenblum e F. kuttner, O Enigma Quântico, o Encontro da Física com a Consciência, tradução de 2ª edição americana por George Schlesinger. Editora Zahar, Rio de Janeiro (2017).

[35] A. Goswami, A Física da Alma, Editora Aleph, 2ª edição, São Paulo (2008).

[36] D. Bohm, Totalidade e a Ordem Implicada, tradução de Teodoro Lorent, pág. 26 e 27, Editora Madras, São Paulo (2008).

[37] Emmanuel, psicografia de F. C. Xavier, O Consolador, questão 79, Editora FEB, 5ª edição, Rio de Janeiro (1970).

[38] A. Kardec, O Livro dos Espíritos, Editora FEB, 79ª edição, Brasília-DF (1997).

[39] A. Luiz, psicografia de F. C. Xavier, Nos Domínios da Mediunidade, Editora FEB, 13ª edição, Brasília-DF (1984).

[40] Como já nos referimos, a fusão de núcleos de hidrogênio em hélio deixa um excedente de massa que é convertida em irradiações eletromagnéticas, portanto, nosso Sol está perdendo parte de sua matéria constituinte com o passar do tempo.

[41] C. Rovelli, A realidade não é o que parece, tradução de Silvana Cobucci Leite, 1ª edição, Editora Schwarcz, Rio de Janeiro (2017). Vide o site: https://pt.scribd.com/document/98623857/Gravidade-Quantica-em-Loop (consultado em 21 de outubro de 2019).

[42] Aqui “alfa” e “beta” não dizem respeito a Espírito e Energia, como simbolizado por Ubaldi na Grande Equação da Substância.

[43] P. Ubaldi, La Grande Sintesi, Edizioni Mediterrranee, 7ª Edizione, Roma (1996).

[44] A vertiginosa expansão a que estão submetidas todas as galáxias, distanciando-se aceleradamente umas das outras.

[45] Explosão em supernovas, embora estrelas mais massivas possam terminar seus dias embaladas pelo pulso contrativo, formando estrelas de nêutrons ou buracos negros.

[46] P. Ubaldi, A Grande Síntese¸ tradução de Carlos Torres Pastorino, cap. 58 e 18 respectivamente da 19ª Edição, Instituto Pietro Ubaldi, Campos dos Goytacazes (1997).

[47] A. Kardec, A Gênese, Ed. FEB, 17ª edição, cap. VI, Rio de Janeiro (1975).

[48] Esses números variam ligeiramente conforme a fonte. Vide: https://astronomy-universo.blogspot.com/2013/04/antimateria-materia-escura-e-energia.html (site consultado em 7 de outubro de 2019).

[49] A. Kardec, O Livro dos Espíritos, Editora FEB, 79ª edição, Brasília-DF (1997).

[50] F. Collins, A Linguagem de Deus, Editora Gente, 2ª edição, São Paulo (2007).

[51] A. F. Fonseca, “Uma Análise científica de algumas afirmações de A Grande Síntese”, Jornal de Estudos Espíritas 2, artigo 010203 (2014), pág. 5.

[52] A. Kardec, A Gênese, Ed. FEB, 17ª edição, cap. I, Rio de Janeiro (1975).